
Estou há já bastante tempo para escrever sobre um assunto que voltou a ser debatido na praça pública mais frequentemente após o jogo de Alvalade que opôs o Sporting ao Benfica, o da chamada de Liedson à selecção de todos nós. Como se trata de um assunto pelo qual sinto especial prazer em defender a minha posição, aguardei por um momento em que me sentisse motivado e inspirado para fazê-lo. Momento esse que, olhando para as estatísticas dos últimos jogos da selecção (57 remates nos últimos 3 jogos, 0 golos), creio ter chegado.
Se me permitem o “à parte”, gostaria só de expressar a minha indignação pelas escolhas de Queiroz para a posição mais avançada do terreno e para a qual as opiniões relativas à chamada do levezinho para ocupar o mesmo se dividem. Hugo Almeida tem sido presença assídua nas convocatórias do Professor, em seis jogos marcou um golo e tem deixado muito a desejar nas suas exibições, Orlando Sá foi uma vez chamado à experiência, para começar a habituar-se a estagiar com craques como Cristiano e não mais voltou (pelo andar da carruagem – continua sem ser titular no Braga, assim vai continuar, ausente, por mais alguns meses), Edinho teve agora a sua meia oportunidade, uma vez que para ser considerada “oportunidade” ele teria de ter pisado o relvado, no mínimo, isto quando Queiroz afirmava já terem acabado as experiências, Yannick Djaló foi também apenas uma vez se não me engano. Quem não foi mesmo chamado foi o melhor avançado português da actualidade, de seu nome Nuno Gomes que até é, por acaso, o mais experiente de todos eles (e naturalmente o mais velho, 32 anos), com 29 golos em 75 internacionalizações e com, olhando apenas para os dados no Benfica, 154 golos em 362 jogos, o que dá uma média de pouco menos de meio golo por jogo, média esta espalhada ao longo de muitas épocas de liga portuguesa, intercaladas com uma experiência em territórios italianos, na Fiorentina, onde, ao lado do actual director-desportivo Rui Costa, voltou a ganhar títulos (uma Taça de Itália) nas duas épocas que lá realizou e com a experiência, de que poucos se podem orgulhar, adquirida pelo Mundo fora com a camisola das quinas, já referida há pouco. Pois bem, em todas as revoluções trazidas por treinadores e seleccionadores aos seus clubes/selecções costumam haver sempre preteridos e, neste caso, parece que Queiroz já escolheu o dele há muito tempo, ao não colocar o seu nome em nenhuma das convocatórias. Tenho muita pena, sinceramente, que tenha calhado a fava a um jogador do calibre de Nuno Gomes, que tanto joga e faz jogar.
Voltando ao tema inicial e que me leva a escrever, começo por afirmar que, à típica pergunta do “sim ou não” à chamada de Liedson à selecção das quinas, assim que o seu processo de naturalização esteja concluído, a minha resposta vai, obviamente, incidir no “sim”. Perguntarão porquê.
Em primeiro lugar, acredito, como acho que deve ser, que nem o futebol nem nenhuma actividade se pode sobrepor à lei, isto é, quando se diz que se está contra a chamada de naturalizados à selecção, parte-se de um princípio que vai contra a lei, um jogador que se naturaliza português passa simplesmente a ser português e, como tal, a possuir os mesmos direitos e deveres que têm todos os outros. Se um país estabelece como base para um indivíduo se poder naturalizar, 6 anos de residência no país, então ao fim de 6 anos, não há nada que se possa fazer para contrariar a situação, e uma vez naturalizado, encontra-se em pé de igualdade, relativamente aos restantes jogadores nacionais, no que às convocatórias diz respeito.
Segundo ponto que me parece inegável: uma vez aberta a primeira excepção deixa de haver qualquer argumento contra a chamada de jogadores naturalizados. Fala-se já em estabelecer limites de jogadores deste tipo. Afirma-se que, tendo a selecção nos seus quadros, actualmente, já dois jogadores (nacionalizados) portugueses, de descendência brasileira, não se deve chamar mais que um ou dois ou já não se deve chamar nenhum, invoca-se que, por este andar, qualquer dia teremos 11 jogadores luso-brasileiros a disputar um jogo com a camisola de Portugal, ou até mesmo os 25! Lamento dizer isto, mas a partir do momento em que, nos anos 60, Lúcio (origem brasileira) foi convocado para a selecção, o precedente está aberto, pelo que eticamente não se pode delimitar um número de jogadores, na minha opinião, vai contra os Direitos Humanos. Convoca-se o 1º (Lúcio) e porque é que o 2º, que está nas mesmas condições, também não tem os mesmos direitos? E, se o 1º e o 2º foram convocados porque é que também não o pode ser o 3º? E assim sucessivamente… Chegamos aos 15 nacionalizados numa convocatória. Estabelecer um limite de 15? Porque é que o 16º, que se calhar até é mais português que os outros, não pode? E assim sucessivamente…
Argumento que penso estar totalmente errado é também o que justifica o “sim” à chamada de jogadores naturalizados consoante a sua qualidade. Assim, se o jogador tiver qualidade, “sim”, senão, “não”. Aqui está-se já a entrar num domínio completamente fora do debate, uma vez que já nada tem a ver com a chamada de jogadores naturalizados. Foram várias as pessoas que ouvi pronunciarem-se a favor da chamada de Liedson, pelo facto do ainda brasileiro ter uma qualidade acima da média. A uma destas pessoas perguntei eu: então e se o jogador for mau, és contra? Ao que este respondeu, como esperava: sim. Digo que isto já nada tem que ver com o debate, visto que isto tanto acontece com brasileiros, franceses, ingleses, japoneses, etc, que se queiram nacionalizar portugueses, como com os jogadores de origem nacional: se forem bons, sou a favor, se não, sou contra. Mas quer dizer, podemos debater todas estas convocatórias, mas o seleccionador é que tem o poder e a liberdade para escolher os nomes que pretende que façam parte do grupo. Se este entender convocar metade de jogadores de qualidade bastante duvidosa, sem quaisquer provas dadas, para não dizer maus, as pessoas têm de aceitar, mas, como disse, isto tanto se passa nos jogadores portugueses, como em todos os outros, pelo que penso que esta questão transcende a questão principal – uma vez naturalizado, um jogador passa a pertencer ao país, como cidadão do mesmo, e a ter os mesmos direitos e deveres dos restantes, independentemente das suas qualidades profissionais.
Para terminar, referir só que há um pequeno bicho, em relação ao qual não vale a pena lutar, visto ser inevitável e ter tendência para aumentar a cada dia que passa, chamado “globalização”, e que se caracteriza como uma integração e interacção de pessoas de todo o Mundo nos seus diversos cantos, na qual os aspectos culturais, por exemplo, fazem parte dessas interacções, o que, por sua vez, contribui para uma cada vez maior ausência de fronteiras entre países, isto é, uma menor distinção das culturas predominantes em cada país.